Débora Zampiér – do Comunidade Segura
Falar em feira de segurança logo traz a idéia de comercialização de equipamentos e de tecnologia de ponta para barrar a crescente violência no país. E quando o material de troca é experiência, e ao invés de concorrentes, os expositores são parceiros? Foi com essa proposta que a Feira de Conhecimento em Segurança Pública com Cidadania atraiu mais de quatro mil visitantes e se tornou um dos principais destaques da 1ª Conferência Nacional de Segurança Pública (Conseg). O evento aconteceu em Brasília, de 27 a 30 de agosto.
A feira reuniu 41 práticas selecionadas entre 224 projetos de todo o país, e mostrou que a busca pela paz social de forma cidadã está em alta. Os projetos inscritos precisavam estar de acordo com pelo menos um dos sete eixos temáticos da Conseg. “Nos surpreendeu a diversidade de instituições inscritas e de propostas oferecidas. Apesar de algumas ações serem conhecidas, quisemos projetar iniciativas quase invisíveis em nível nacional”, explica Luciane Patrício, coordenadora da feira.
Para garantir uma experiência completa aos participantes, o evento apostou nas rodas de negócios, criadas para promover e facilitar a assinatura de cartas de intenções. Desprovidas de valor jurídico, as cartas selaram vínculos entre expositores e visitantes para uma futura transferência de conhecimento e de assistência técnica. “Gostei bastante da proposta, porque ela ajuda a consolidar uma intenção de conhecer mais a fundo as experiências. O trabalho começa a partir daqui”, opina Ricardo Mello, expositor do projeto Pólos da Paz e Praças da Paz, do Instituto Sou da Paz.
A idéia foi tão bem sucedida que os seis negociadores disponíveis não foram suficientes para selar as 707 cartas de intenção resultantes da feira, e os próprios expositores precisaram se encarregar da tarefa. “Não imaginávamos que a estratégia daria tão certo por aqui, já que os brasileiros têm um certo receio de assinar papel”, explica Erica Machado, do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud) no Brasil.
Um dos responsáveis por trazer a metodologia da feira pela primeira vez ao Brasil, Rogerio Matallana, do Centro Regional de Conhecimento para América Latina e Caribe (órgão do Pnud na Colômbia), acredita que a verdadeira inovação da feira é a inversão de papéis. “Em uma conferência tradicional, a teoria é explicada para aqueles que atuam na parte teórica. Aqui, os protagonistas são aqueles que executam, e os pesquisadores vêm absorver conhecimento”, explica Matallana.
Com experiência em feiras de conhecimento desde 2002, o representante do Pnud acredita que, apesar de significativa, a quantidade de cartas assinadas não é o mais importante. “Se pelo menos um projeto de segurança pública consistente e útil para a sociedade for extraído dessas cartas, cumprimos nosso papel”, avalia Matallana. Após analisar as cartas, o Ministério da Justiça deverá estimular projetos a partir de investimentos do Fundo Nacional de Segurança Pública (Susp) que foi consolidado em um dos princípios aprovados durante a conferência.
Municípios em foco
A feira foi aberta na quinta-feira (27), pelo ministro da Justiça, Tarso Genro e ficou aberta para visitação pública até o último dia da conferência. Os visitantes, que também podiam optar pela visita guiada, recebiam cédulas para votar em suas experiências preferidas. Os projetos vencedores, ainda não divulgados, ganharão uma viagem a cidades colombianas para conhecer novas práticas de segurança.
Entre os 41 projetos selecionados, 28 foram iniciativas de instituições públicas. É o caso da Rede de Promoção de Ambientes Seguros (Repas) – o Batalhão Participativo, do 10º Batalhão de Polícia Militar do Espírito Santo e da Prefeitura Municipal de Guarapari. Em pouco mais de um ano de funcionamento, os avanços conquistados pelo projeto são motivo de orgulho para a corporação.
Em reuniões quinzenais, representantes do poder público e da sociedade debatem e buscam solucionar problemas de risco social detectados pelos policiais militares nas ruas de Guarapari. “Percebemos que a iniciativa para essa articulação tinha que ser nossa. Queremos desmistificar a imagem de que polícia é arbitrária, agressiva, e mostrar ao povo que ela é cidadã, que dependemos da comunidade para o êxito do nosso trabalho”, explica o expositor Tenente Carmo.
Segundo o policial capixaba, o que mais o impressionou na feira foi o fato de o evento reunir tantas idéias diversas visando o mesmo objetivo final – promover a segurança com cidadania – vindas de locais tão distantes. É o caso do Plano Municipal Integrado de Segurança Pública de São Carlos (SP), mais um dos projetos selecionados para a feira.
Na ativa desde 2001, o plano foi dividido em três edições, cada uma com diretrizes específicas voltadas à pacificação social no nível municipal. Em andamento este ano, a terceira versão estabeleceu como metas a implantação da Ronda Escolar pela Guarda Municipal (instituição criada pelo plano em 2001) e a aquisição de caminhão para o Corpo de Bombeiros. “Aqui trocamos experiências com os outros expositores e aproveitamos para aprimorar medidas de gestão já adotadas em São Carlos”, comentou o expositor Marcos Martinelli, secretário Municipal de Governo.
Projetos especiais e cultura
A feira não ficou restrita à exposição de práticas. Além da presença de vários estandes institucionais, como o interativo espaço do Programa Nacional de Segurança Pública com Cidadania (Pronasci) e do próprio Pnud, vários projetos especiais e manifestações culturais movimentavam os corredores da Ala Sul do Centro de Convenções Ulysses Guimarães.
A Feira de Artesanato do Sistema Penitenciário, promovida pelo Departamento Penitenciário Nacional (Depen) do Ministério da Justiça e pela Pastoral Carcerária, expôs e comercializou vários artigos produzidos por presos e presas de todo o país. Objetos de decoração, brinquedos, itens de beleza, tudo feito com o objetivo de motivar os detentos e facilitar sua reinserção social.
A Depen também promoveu a mostra fotográfica “Através das lentes: retrato da realidade penitenciária – a ótica da presa e do preso”, com trabalhos de oito estabelecimentos penais brasileiros. As crianças também mostraram sintonia com a temática segurança e cidadania em uma mostra de desenhos. A exibição de filmes e de artistas, como o violonista Marcelo Café e a atriz, cantora, compositora e instrumentista Ellen Oléria, deram mais um toque cultural à feira.
Os sete eixos temáticos:
Eixo 1 - Gestão democrática: controle social e externo, integração e federalismo
Eixo 2 - Financiamento e gestão da política pública de segurança
Eixo 3 - Valorização profissional e otimização das condições de trabalho
Eixo 4 - Repressão qualificada da criminalidade
Eixo 5 - Prevenção social do crime e das violências e construção da cultura de paz
Eixo 6 - Diretrizes para o sistema penitenciário
Eixo 7 - Diretrizes para o sistema de prevenção, atendimentos emergenciais e acidentes
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