Mais do que dobrou, em um ano, a taxa de mortalidade por tuberculose no sistema penitenciário estadual do Rio de Janeiro. Em fevereiro deste ano, morreu um preso a cada dois dias, nos postos de saúde do sistema. O agravamento dessa mórbida estatística é um dos efeitos da superlotação. Atualmente com 30.282 presos, a população está 26% superior à capacidade das unidades prisionais. Enquanto isso, o quadro de profissionais de saúde se reduziu de 1.200 em 1995, para 700 em 2011. Há apenas dois médicos atualmente no sistema. Eram 11 em 2005. Também pioraram os salários e as condições de trabalho. Esse grave diagnóstico deu o tom de emergência da audiência pública realizada nesta terça-feira (17/4) pela Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Alerj. O debate durou cinco horas.
A superlotação surgiu como efeito do fechamento das carceragens da Polícia Civil, a partir de abril do ano passado. Restam ainda nas unidades policiais cerca de 300 presos. Estima-se que até 2016 a população prisional terá chegado a 52 mil encarcerados. Há cerca de um ano, em audiência pública também sobre a questão prisional, o presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos de Direitos, deputado estadual Marcelo Freixo (PSOL-RJ) alertou que haveria superlotação nos presídios sem um planejamento prévio que envolvesse a criação de novas vagas no sistema. Nesse contexto, a taxa de mortalidade subiu de 0.25/ 1 mil presos em fevereiro de 2011 para 0.53/1 mil no mesmo mês deste ano.
“Alertei para o risco da transferência para a Seap dos problemas que havia na Polícia Civil, de que seria uma mera mudança de endereço”, lembrou o parlamentar. “O número de óbitos de presos é absurdo. Se continuar assim, se nada for feito para garantir condições mínimas de saúde nas prisões, teremos de responsabilizar judicialmente o governador Sérgio Cabral”, afirmou o deputado. Como principal encaminhamento da audiência, houve a cobrança da contratação emergencial de profissionais de saúde para a Seap, enquanto não há a realização de concurso público, de pelo menos sete médicos. Além disso, será criado um Grupo de Trabalho para monitorar o encaminhamento das ações emergenciais necessárias na saúde do sistema prisional.
Em inspeção realizada pelo Mecanismo de Prevenção e Combate à Tortura do Estado do Rio de Janeiro, entre agosto de 2011 e março deste ano, foi possível verificar a superlotação em seis das oito unidades visitadas. Os casos mais graves foram encontrados no Ary Franco, na Água Santa, com 1.680 presos, onde deveria caber até 958, e no Vicente Piragibe, com 2.300 presos, em lugar para, no máximo, 1.444.
De acordo com os próprios profissionais de saúde da Seap, a superlotação do sistema ocorre aliada à falta de profissionais, de unidades de atendimento, de transportes de pacientes, de equipamentos e de medicamentos, em um ambiente insalubre e com alimentação inadequada. Tudo isso tem criado as condições propícias para a proliferação de doenças contagiosas. No caso da tuberculose, a incidência dentro do sistema, com 572 casos registrados em 2010, está 36 vezes maior do que a incidência na população em geral. O quadro se agravou com o fechamento dos hospitais penitenciários. Hoje, o sistema carece de recursos humanos e materiais mesmo para a própria diagnose do problema.
“A realidade não é muito diferente da que se encontra na saúde pública do país e de diversos estados”,admitiu o secretário de Administração Penitenciária, coronel César Rubens. “Trata-se de um segmento da sociedade que a própria sociedade quer esquecer que existe”,concluiu o secretário, referindo-se à população do sistema que administra e no qual um em cada 20 presos sofre atualmente do mal da tuberculose.
Participaram da audiência, além do titular da Seap, representantes da Secretaria Estadual de Saúde, do Grupo Executivo de Delegacia Legal da Secretaria Estadual de Obras, da Vara de Execuções Penais, do Ministério Público e da Defensoria Pública estaduais, do Mecanismo de Prevenção e Combate à Tortura do Estado do Rio de Janeiro, da OAB-RJ, do DDH-RJ, da Escola Nacional de Saúde Pública da Fiocruz, do Fórum Permanente do Sistema Penitenciário, Conselho Federal de Medicina, do Fórum das ONGs de Combate à Tuberculose do Rio de Janeiro. Além de Freixo, participaram também os deputados Rejane, Robson Leite, Paulo Ramos, Flávio Bolsonaro, Edson Albertassi, André Lazzaroni.
Houve ainda a participação especial na audiência de Dona Maria de Lourdes Cabral de Souza, mãe de João Paulo da Souza Silva, de 28 anos, cadeirante, em cumprimento de pena no presídio Muniz Sodré, com suspeita de tuberculose. Ela fez um apelo para a necessidade de atendimento urgente para o seu filho, que ela ainda tem esperança de que consiga sair vivo após cumprir sua pena no sistema prisional do Rio.
Via MarceloFreixo.com
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