quarta-feira, 25 de novembro de 2009

Escândalos mudam estrutura na polícia em MG


Pacote de medidas preparado pela Superintendência Geral quer moralizar corporação

Por Andréa Silva, do O Tempo


Criado em 2004, o Grupo de Resposta Especial (GRE) nasceu com um desafio: ser reconhecido como a tropa de elite da Polícia Civil de Minas. A missão dos 30 policiais escolhidos a dedo pela cúpula da corporação para formar a unidade - entre delegados, inspetores, subinspetores e agentes de polícia - era agir em situações nas quais o que se espera é justamente a habilidade, o rigor e a competência daqueles apontados como os melhores policiais do Estado.

Mas uma série de escândalos e denúncias, que vi
eram à tona nas duas últimas semanas, levou a Superintendência Geral da Polícia Civil a anunciar a reformulação completa na corporação.

As denúncias vão desde o envolvimento de integrantes do GRE em irregulari
dades, como compra fraudulenta de veículos, extorsão, a até crimes mais graves, como ameaças de morte e ação de um grupo de extermínio (veja quadro abaixo). As mudanças previstas, ainda não divulgadas oficialmente e sem data para vigorar, vão afetar toda a Polícia Civil.

A reportagem de O TEMPO confirmou que o Conselho S
uperior da Polícia Civil está finalizando o pacote de medidas que vai alterar a formação doutrinária dos policiais e também a forma de atuação da corporação em ações práticas. Em suma, o que se pode esperar do plano, garantem fontes da Polícia Civil, é que os policiais serão cobrados a agir com uma conduta muito mais rigorosa e ética. Já em relação às ações táticas, o plano quer priorizar o trabalho de investigação, e não somente operações de caráter repressivo.

Em relação ao GRE, o desafio da Corregedoria da Polícia
Civil agora é separar o joio do trigo e direcionar as investigações àqueles que realmente mancharam a imagem do grupo. Algumas medidas foram tomadas desde que provas de alguns dos crimes se confirmaram, há 15 dias: oito dos 30 policiais que integram a unidade não estão mais no GRE - dois estão impedidos de participar de operações e seis foram transferidos para outras unidades da Polícia Civil.

O Ministério Público, por meio da Promotoria de Fiscalização da Atividade Policial, também está no caso e solicitou à Corregedoria da Polícia Civil informações sobre as investigações. Não há prazo para o fim do inquérito, mas o que se espera é que o banho de ética realmente funcione.

Ao todo
10 mil
agentes integram a
Polícia Civil em Minas



Documentos
“Provas estão ganhando forma”, denuncia deputado


O presidente da Comissão dos Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, deputado Durval Ângelo, disse que, embora só tenham vindo à tona agora, os escândalos envolvendo integrantes do GRE surgiram em meados de 2008. “Desde o início, as denúncias estão sendo apuradas pela Corregedoria. Antes, não existiam provas, mas, agora, elas estão ganhando forma”, afirmou. Em março deste ano, disse, fotografias que comprovam o esquema de compra de carros com uso de documentos falsos ou roubados foram anexadas ao dossiê.

Na última semana, uma outra grave denúncia apareceu. O parlamentar contou que foi procurado por uma mulher que acredita que o marido seja uma das duas vítimas, apontadas na denúncia, do grupo de extermínio supostamente formado com a participação de policiais do GRE.

O duplo assassinato teria ocorrido em um barracão de madeira, que, conforme a denúncia, foi apelidado pelos próprios policiais de “casa de matar”. O documento aponta que as vítimas teriam sido torturadas e ainda tiveram os corpos esquartejados e queimados. O sumiço d
os dois homens está sendo investigado pela Divisão de Referência da Pessoa Desaparecida. (AS)


Análise
Especialista defende a extinção


Conquistar uma vaga no Grupo de Resposta Especial (GRE) da Polícia Civil de Minas Gerais não é uma tarefa fácil. O policial candidato precisa se destacar entre os colegas para poder, então, passar pelo acirrado processo seletivo. Caso seja aprovado, o aspirante à chamada tropa de elite mineira ainda enfrenta rigorosos testes de aptidões físicas e psicológicas.

O treinamento do agente especial tem duração de um ano. Entre os testes para integrar o grupo estão simulação de rendição de criminoso mediante negociação, entradas em áreas de alto risco, simulação de combate real e incursão em presídios em casos de rebeliões.

Segundo a Polícia Civil, os exercícios simulam combates e com alto nível de estresse, tudo com o objetivo de criar no policial a frieza necessária para agir em situações extremamente perigosas.

Porém, os trabalhos executados pelos agentes do GRE são alvos de críticas de especialistas. O coordenador do Centro de Estudos em Segurança Pública da PUC Minas, Luiz Flávio Sapori, que acompanhou a criação do GRE, na época como secretário adjunto da Secretaria de Estado de Defesa Social (Seds), explica que a unidade especial nasceu diante de uma crise.

Na ocasião, conforme Sapori, Belo Horizonte enfrentava um crescimento acelerado da violência e da criminalidade, e a população cobrava ações. “Atendendo ao clamor público, a Polícia Civil então criou a sua unidade tática. Ela nasceu de forma errada, fazendo a função da Polícia Militar especializada”.

De acordo com Sapori, o GRE acabou disputando espaço com o já existente e bem estruturado Grupo de Ações Táticas (Gate) da Polícia Militar, apontado pelo especialista como um dos melhores do país. Isso, segundo ele, gerou uma rivalidade entre os dois grupos, o
que acabou atrapalhando o projeto de integração das duas corporações. “O atual governo deve pensar seriamente se o grupo é realmente importante. Fui contra a sua criação e sou a favor de sua extinção”, afirma.

O desconforto gerado pelo surgimento do grupo de elite da Polícia Civil e os benefícios destinados à unidade e aos membros da equipe afetaram também os próprios policiais civis de outras unidades. “Eles ficam com os melhores carros, melhores armas e ainda têm um helicóptero à disposição. Enquanto isso, temos que nos virar com veículos velhos e armas de baixo poder de fogo”, reclama um policial civil, que pediu para não ser identificado.

Para o diretor de assuntos internos do Sindicato dos Servidores da Polícia Civil de Minas Gerais (Sindpol/MG), o policial Valério Schettino Valente, as duas polícias estão sofrendo inversões de papéis. “A Militar, que é a ostensiva fardada, deveria atuar nas ações preventivas, mas está fazendo investigações, muitas vezes descaracterizada. Já a Civil, a judiciária, tem fun
ção investigativa, mas está indo a campo, inclusive usando uniformes como ocorre com o GRE”.

Valente explica que não é contra a atuação do GRE, nem defende sua extinção. “Eles estão enfrentando um momento difícil. Precisamos unir forças e defender os profissionais do bem. Mas, se houver algum culpado em relação às denúncias, ele deve ser punido e responder p
elo crime”.

Para Valério Valente, apesar dos escândalos envolvendo o GRE nos últimos dias, a maior parte do efetivo da Polícia Civil é de pessoas honestas e isso é o que deve ser considerado pela população.

Vaidade
Disputa dividiu a corporação


Quando os problemas internos do Grupo de Resposta Especial (GRE) da Polícia Civil surgiram, o motivo apontado pelos agentes envolvidos no conflito foi a disputa pelo poder. Desde sua criação, de acordo com a assessoria de imprensa da Polícia Civil, pelo menos cinco delegados estiveram à frente da unidade.

A “guerra” entre os agentes, porém, acirrou-se quando um inspetor assumiu o comando do grupo. “O que aconteceu foi uma disputa pelo poder. O GRE cresceu, e isso acabou despertando o interesse em muitos policiais. Quando o inspetor assumiu, isso gerou conflito, porque ele ocupou o cargo de um delegado”, contou um policial. Atualmente, quem comanda o grupo é o delegado Élcio Sá Bernardes, que não quis comentar as denúncias envolvendo a unidade. (AS)


“Não sou a favor da extinção do GRE.
Precisamos defender os policiais do bem.
Mas se algum for ulpado, que pague pelos seus erros”
Valente - Diretor do Sindpol/MG

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Mais Lidos