segunda-feira, 21 de junho de 2010

Anistia Internacional: Brasil ainda deixa a desejar

Por Cecília Olliveira

Violência policial, atuação de grupos paramilitares, elevado número de mortos por ação policial, detentos mantidos em condições cruéis, desumanas ou degradantes. As diferenças entre a edição de 2009 e 2010 do Informe da Anistia Internacional são poucas e as situações relatadas em ambas não tiveram grandes mudanças.

“Os detentos continuaram sendo mantidos em condições cruéis, desumanas ou degradantes. A tortura era utilizada regularmente como método de interrogatório, de punição, de controle, de humilhação e de extorsão. A superlotação continuou sendo um problema grave. O controle dos centros de detenção por gangues fez com que o grau de violência entre os prisioneiros aumentasse”, denuncia o relatório.

De acordo com o Informe 2010, fora do escopo dos projetos implantados pelos governos, como as Unidades de Polícia Pacificadora, as forças policiais continuaram a cometer violações extensivas e discriminar os moradores. Em entrevista a Agência Brasil, o representante da Anistia para assuntos do Brasil, Tim Cahill, disse temer que esta “seja uma questão isolada para fazer uma publicidade enquanto uma política mais pragmática e mais tradicional de repressão, discriminação e abuso de direitos humanos continua sendo utilizada, de uma forma geral. É isso que temos visto em várias operações policiais em comunidades do Rio de Janeiro, que resultam em mortes”.

Para o sociólogo Ignacio Cano, professor e membro do Laboratório de Análise da Violência da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (LAV-Uerj), o Relatório é bastante crítico e um pouco injusto. “Hoje a situação é bem melhor que antes, já que antes sequer existia a possibilidade de denunciar qualquer ação por parte dos policiais. A análise feita foi dos efeitos em curto prazo. O resultado da implantação das UPPs será visto no longo prazo”, explicou Cano, que disse ainda que o que falta é colocar estas demandas no centro da discussão da agenda pública.

Direitos Humanos

Tortura e desaparecimento nas Américas e violações aos direitos humanos ocuparam lugar de destaque na publicação. Pessoas foram indiciadas, processadas e condenadas no Chile, Colômbia, Peru, Paraguai e México. O Brasil está no grupo do outro lado, daqueles em que as leis de anistia continuam a impedir que violadores prestassem contas de seus atos, junto com El Salvador e Uruguai. De acordo com o Informe, governos da região da América Latina pouco fizeram para coletar dados e analisar de fato os problemas e menos ainda para impedir os abusos ou levar responsáveis à justiça.

“Desaparecidos do Araguaia: quem procura osso é cachorro”, eram os dizeres de um banner, que espelha a situação relatada na publicação, e que estava pendurado na porta do gabinete do deputado e ex-militar Jair Bolsonaro (PP-RJ), causando muita polêmica na Câmara. O parlamentar é conhecido por posicionamentos pró-atuação militar, instituição da pena de morte, redução da maioridade penal e endurecimento de penas.


Cartaz fixado na porta do gabinete do deputado e ex-militar Jair Bolsonaro, causou polêmica na Câmara


No Brasil, Jamaica, Colômbia e México as forças armadas foram acusadas de abuso e de centenas de homicídios ilegais, no país, registrados como autos de resistência. Descarte de denúncias por as considerarem falsas, “feitas com a intenção de desonrar as forças de segurança”, também foram listadas no documento.

“Esta conduta é decorrente da lógica atual das políticas de segurança pública baseadas na repressão, seja pelo viés do enfrentamento e do extermínio, seja pela lógica de cerceamento de liberdade e produção de obediência”, explica o deputado federal e presidente da Comissão de Defesa dos Direitos Humanos e Cidadania da Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, Marcelo Freixo, que está ameaçado de morte por grupos paramilitares devido a sua atuação contra o crime. “Atualmente, prevalece a lógica do policiamento, o que por si só não avança, mas, sim, faz retroceder na garantia de direitos. Para nós [da Comissão de DH], segurança pública significa políticas que promovam a cidadania plena, isto é, a garantia dos direitos humanos entendidos como universais e respeitando a diversidade de cada sujeito e de cada realidade”, reitera.


2008: Marcelo Freixo entrega o relatório completo da CPI das milícias a Tim Cahill, representante da Anistia Internacional para assuntos do Brasil



Poucos elogios

Diante de tantos pontos negativos, o Informe enalteceu a realização da primeira Conferência Nacional de Segurança Pública – CONSEG, onde profissionais da área e sociedade civil se uniram para o desenvolvimento de políticas governamentais.

O outro elogio é para o PNDHIII, embora, logo em seguida, venha a ressalva às criticas e pressões feitas por representantes da Igreja Católica, das grandes empresas de comunicação, do agronegócio e de setores militares, que resultaram no decreto nº 7.177, com varias alterações ao plano original.

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