Pouco mais de um ano após a entrada em vigor da lei das medidas cautelares à prisão, as estatísticas revelam que vem aumentando e não diminuindo o número de presos provisórios nas cadeias brasileiras.
Quando a lei foi editada, o sensacionalismo da imprensa dava conta de que centenas de milhares de presos seriam soltos imediatamente. Não à toa: a estratégia punitiva visava justamente pressionar os operadores do direito com argumentos terroristas, atribuindo aos juízes uma responsabilidade que efetivamente não tem sobre a política de segurança pública.
Hoje, com a constatação de que a população carcerária cresceu e a população de presos provisórios cresceu ainda mais, podemos dizer com clareza que mais prisão não tem representado mais segurança ou menos criminalidade –como, aliás, o país já havia descoberto durante a vigência da Lei dos Crimes Hediondos.
Há que se ter cautela no diagnóstico, mas o ressurgimento da fiança pode ter contribuído para a expansão prisional. Afinal, a expressiva maioria de furtadores presos, por exemplo, não tem capacidade para pagar os múltiplos de salário mínimo que a lei e os juízes determinam.
Aliás, a ideia de ganhar a liberdade pagando uma quantia em dinheiro, que é injustificável em si mesma, desconhece profundamente o panorama criminal e carcerário brasileiro.
Fato é que a interpretação da lei tem feito com que as medidas cautelares, criadas como alternativas à prisão, se transformem em alternativas à liberdade. Com isso o efeito está sendo reverso daquele que aparentemente se pretendeu alcançar.
Uma nova lei que acaba de ser sancionada pela presidenta Dilma Roussef poderá permitir a correção de algumas distorções do excesso de prisão cautelar.
Com a lei 12.736/12, o art. 387, §2º, do Código de Processo Penal, incorporou o que se vinha chamando de ‘detração analógica’, aplicada ainda com enorme hesitação.
A partir de agora, o juiz deverá obrigatoriamente considerar no momento da fixação do regime inicial de cumprimento de pena (o que faz na sentença) o prazo que o condenado já cumpriu em prisão provisória.
Assim, se manteve o réu preso no curso do processo por um tempo considerável, necessário para uma progressão, deve estabelecer desde logo o regime que seja compatível com este prazo já cumprido. Por exemplo, fixar o semiaberto, quando a prisão cautelar representou pelo menos 1/6 da pena que originariamente seria fixada em regime fechado.
É certo que a prisão cautelar tem os seus requisitos próprios de urgência e não deve ser tratada como uma espécie de antecipação da pena.
Mas, uma vez que ela tem se estendido ao longo do tempo, e significado, na prática, uma parte expressiva da punição (muitas vezes quase integralmente cumprida antes da sentença), que seja, ao menos, considerada no momento da decisão para reparar eventual injustiça.
Quem sabe a medida atenue, ainda que em dose quase insignificante, os possíveis reflexos que o recente recrudescimento da dosimetria penal no STF pode causar se efetivamente chegar nas instâncias inferiores.
Por Marcelo Semer.
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