sábado, 6 de fevereiro de 2010

Especialistas apontam ligação entre comportamento machista e abuso


Gilberto Costa - da Agência Brasil


Numa manhã de quinta-feira, a adolescente Samira aguardava sob escolta policial o início da sessão da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Assembleia Legislativa do Maranhão, que apura casos de abuso sexual.

Naquele dia, os parlamentares aguardavam o depoimento do pai da jovem, acusado de abusar da menina desde que ela tinha 8 anos de idade. O pai chegou a ser preso por cinco meses.

No colo de Samira, uma criança de cerca de 3 anos. A garotinha é, ao mesmo tempo, sua filha e meia-irmã. Ou seja, a criança é filha e neta do pai de Samira, um pequeno agricultor de 43 anos.

No início do ano passado, ele migrou de Pau d'Arco (PA) para Colinas, no sudeste do Maranhão, levando a jovem. Pouco tempo depois, ele foi denunciado à CPI pela irmã mais velha de Samira.

Os depoimentos iam ser tomados em separado, mas o abusador não compareceu. O destino de Samira, que aguarda a comprovação da paternidade, não pode ser revelado, pois ela e a filha estão sob proteção.

A história da jovem paraense exemplifica os vários casos de abuso sexual intra-familiar que ocorrem no Brasil, em pleno século 21.

Para diversos especialistas ouvidos pela Agência Brasil, não há um perfil do abusador infantojuvenil, mas, em muitos casos, o machismo pode ser observado no comportamento de quem subjuga crianças e adolescentes.

“É machismo. O homem tem a filha como se fosse a sua propriedade”, aponta a advogada Leila Paiva, coordenadora do Programa Nacional de Enfrentamento da Violência Sexual contra Crianças e Adolescentes. “O corpo da mulher foi encarado o tempo todo como propriedade. Antigamente, ela casava e tinha de mudar de nome, passar para o homem, como fosse uma escritura.”

A titular da Delegacia de Proteção de Criança e Adolescente (DPCA) de Brasília, Gláucia Cristina Ésper, chama a atenção para o mesmo comportamento. “Existe um negócio que se chama coisificação da criança. A criança é propriedade deles. Um objeto que eles podem fazer o que quiser. Tem pai que acha que tem o direito de tirar a virgindade.”

A socióloga Graça Gadelha afirma que o machismo se associa à dominação dos mais velhos sobre os mais jovens.

“Nós temos uma matriz cultural que é extremamente machista e adultocêntrica. Temos um trato da sexualidade que compromete as relações entre pessoas de níveis diferentes, sobretudo quando fazemos o recorte de geração”, afirma a socióloga, que coordena o Programa de Ações Integradas e Referenciais de Combate à Exploração Sexual Comercial e Tráfico de Crianças e Adolescentes para Fins Sexuais, financiado pela Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (Usaid).

Para a psicóloga social Maria Luiza Moura Oliveira, do Conselho Federal de Psicologia, as mulheres também ajudam a manter a cultura machista.

“Nós, mulheres, corroboramos com isso quando a gente educa de forma diferente nossos meninos e nossas meninas”, faz o mea culpa a psicóloga Sandra Santos.

“Qualquer um que tenha uma atitude machista contribui para que haja violência contra a criança e o adolescente, para que sejam tratados como objeto”, acredita Leila Paiva.

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