sábado, 6 de fevereiro de 2010

Pesquisa em presídios de Goiás investiga comportamento de abusadores de crianças e adolescentes


Gilberto Costa - da Agência Brasil

A psicóloga Karen Michel Esber afirma que os números oficiais de denúncias de abuso sexual não representam o total de casos
Goiânia - A psicóloga Karen Michel Esber afirma que os números oficiais de denúncias de abuso sexual não representam o total de casos
Brasília - Um grupo de especialistas realiza desde 2004 em Goiânia uma série de pesquisas para entender o comportamento de autores de violência sexual contra crianças e adolescentes que estão presos.

O projeto Invertendo a Rota, do Centro de Estudos, Pesquisa e Extensão Aldeia Juvenil da Universidade Católica de Goiás, visa a compreender as relações sociais que levaram essas pessoas a cometer crimes de abuso sexual e a construir novas metodologias de atendimento dos agressores.

No final do ano passado, o projeto foi premiado pela Financiadora de Estudos de Projetos e Programas (Finep) e contará com R$ 500 mil para novas pesquisas e programas.

A intenção das coordenadoras do projeto é aproveitar o financiamento para criar um curso de especialização de assistência psicossocial de autores de violência; desenvolver um estudo sobre adolescentes que sofreram violência; e ainda avaliar o atendimento de vítimas em serviços como o Disque 100.

As pesquisas do Invertendo a Roda tiveram início com o Programa de Atendimento ao Autor de Violência Sexual. De acordo com uma das fundadoras do programa, a psicóloga Karen Michel Esber, cerca de 70 casos foram acompanhados. “Nós não concordamos com a violência sexual e é exatamente por não concordar que a gente quer intervir e conhecer esse sujeito.”

Também envolvida com o projeto, a psicóloga social Maria Luiza Moura Oliveira explica que a intenção é fazer com que cada autor de violência tenha a possibilidade de refletir sobre o que ele fez com a sociedade e o que a sociedade fez com ele. “É essa possibilidade que não está dada dentro do sistema carcerário e é essa possibilidade que a gente quer construir”, detalha.

A iniciativa das pesquisadoras desafia o senso comum e a visão dos chamados operadores do Direito, geralmente, limitada à punição.

“Nos processos há transcrições de falas dos promotores dizendo coisas como: 'que esse psicopata apodreça na prisão', mas as pessoas esquecem que ele não vai apodrecer na prisão. Muitos, em menos de dez anos, vão sair e estarão de novo na mesma sociedade, com a mesma família e de novo com crianças. Será que adianta apenas a prisão?”, questiona Karen Michel Esber.

“Só a prisão é pouco. Trancafiar a pessoa e daqui a pouco soltar não muda os sentimentos. Ele só não vai reincidir se mudar seu trajeto de vida”, avalia a psicóloga Mônica Café.

“A pessoa tem que ser penalizada, mas não precisa ser massacrada. É preciso ouvir quais saídas ela mesma vai apontar para a sociedade”, complementa Maria Luiza Oliveira.

Mônica Café acredita que possa haver tratamento que evite a reincidência. “A possibilidade de controle existe: autocontrole, controle externo, psicoterapia, medicamento para ansiedade”, lista.

Ela explica que, no atendimento psicoterapêutico, o processo tem o intuito de fazer com que o abusador veja a criança como “sujeito, alguém que sente e tem suas necessidades”. Segundo a especialista, nas situações de abuso, a criança é considerada, pelo agressor, mero objeto de prazer sexual.

Segundo as especialistas, abusadores de crianças e adolescentes ocupam o último lugar na hierarquia interna dos presídios.

“É um crime sem perdão, mesmo dentro do sistema carcerário”, aponta Maria Luiza Oliveira. Ela conta que, dentro dos presídios, os autores de violência sexual são reconhecidos e também abusados sexualmente.

Segundo a especialista, os presos usam sinais próprios para identificar os abusadores, como a sobrancelha raspada ou a testa marcada com o número do artigo do Código Penal (213) para os crimes que atentam contra a liberdade sexual.

De acordo com a psicóloga, a situação prisional faz com que os autores de violência sexual neguem que tenham cometido o crime. “Começam a negar para eles próprios. Muitos lutam contra admitir que cometeram esse crime”, relata Maria Luiza.

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