Por Cecília Olliveira
Especial para o PRVL
Dados divulgados pela Secretaria Especial dos Direitos Humanos e Secretaria Nacional de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente revelam que, pela primeira vez em 20 anos, a taxa de crescimento de internações vem diminuindo sucessivamente desde 2004.
Entre 2006 e 2007, o aumento no número de internações foi de 7%. No período de 2007 e 2008, a taxa foi da ordem de 2%. Consolidando a série de sucessivas quedas de crescimento, entre 2008 e 2009, o índice registrado foi de 0,4%. Enquanto o número de adolescentes em medidas socioeducativas privativas de liberdade dobrou entre 1996 e 1999 (102%), no último triênio (2006-2009) cresceu 2%.
Alguns pontos chamam a atenção. Entre 2008 e 2009 o número de adolescentes privados totalmente de liberdade atendidos no Rio de Janeiro caiu 54% e o número de internados provisoriamente diminuiu 7%. Já o número de atendidos em semiliberdade diminuiu 40%. No acumulado total foi registrada queda de 43% no número de adolescentes atendidos em medidas socioeducativas.
De acordo com a assessora de planejamento e gestão do governo do Estado do Rio de Janeiro, Beatriz Abreu, a redução das taxas é resultado de uma série de iniciativas. “Isso se deve a uma ação conjunta. O trabalho direto com a Vara de Infância e o uso de medidas abertas são algumas delas”, disse. A conselheira do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente) Tiana Santo Sé reitera a posição de Beatriz. “Existem investimentos em outras medidas, em liberdade assistida e meio aberto. O Conanda tem aplicado estas medidas e estimulado sua municipalização”, explica.
Para Tiana, outro motivo pode também ter contribuído para a redução dos índices. “Alguns pesquisadores justificam tal queda nos números porque podem haver situações em que os meninos sequer chegam a ingressar no sistema. Eles morrem antes”, conta. Graziela Sereno, coordenadora do Projeto Atitude Legal, da Organização de Direitos Humanos Projeto Legal, acredita que esta é uma possibilidade no estado do Rio de Janeiro, que, além do menor crescimento no número de internos, também tem um dos maiores índices de homicídios do Brasil. “Será que esses adolescentes não estão nem chegando às unidades de internação?”, questiona.
Direito a não ter direito
O Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) comemora no dia 13 de julho seu aniversário de 20 anos. Os muitos avanços que o ECA trouxe no sentido de garantir os direitos das crianças e dos adolescentes no Brasil, inclusive daqueles em conflito com a lei, ainda não foram, na prática, totalmente efetivados.
É garantido pelo Estatuto que o adolescente internado seja tratado com respeito e dignidade, receba escolarização e profissionalização, habite alojamento em condições adequadas de higiene e salubridade, entre outras coisas. O desrespeito aos direitos estabelecidos não só no ECA, mas na Constituição Federal e na Declaração Universal de Direitos Humanos não são novidade.
Por ocasião dos trabalhos referentes ao dia 18 de maio – Dia Nacional de Luta contra o Abuso e Exploração Sexual de Crianças e Adolescentes –, no ano passado, a reunião nacional do Conanda foi no Espírito Santo. Representantes do Conselho resolveram visitar algumas unidades de internação. “Ficamos surpresos com a precariedade das instalações, com o caos do sistema. Recebemos muitas denúncias de maus tratos e até de homicídios. A situação de adolescentes detidos em contêineres é muito acima do possível. Isso se possível fosse que alguém cumprisse medida em contêiner”, complementa a conselheira. Ao menos três adolescentes foram mortos dentro de unidades de internação capixabas em 2009. O Conanda e autoridades locais se uniram e redigiram um documento intitulado “Carta da Vitória”, com proposições de adequação que, de acordo com Tiana, avançaram pouco.
Para Graziela Sereno, é preciso avançar na aplicação de medidas educativas em meio aberto. O ECA prevê seis modalidades de medidas socioeducativas para adolescentes em conflito com a lei. A internação, apesar de ser a mais grave delas, é a mais comum. “A gente ainda vê muitos adolescentes internados por atos que não justificam esta medida, como uso de entorpecentes e furto de celular”, afirma a psicóloga.
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