quarta-feira, 8 de setembro de 2010

'Não existe segurança sem justiça'

Da Comundiade Segura e Fórum Brasileiro de Segurança Pública

Estabelecer um modelo de gestão de segurança pública capaz não só de reduzir os índices de criminalidade, como também de alavancar o sentimento de segurança, moralidade e ordem junto à comunidade. Esses temas serviram de subsídios para uma reflexão entre os debatedores do “Fórum de Diálogos em Segurança Pública”, que ocorreu na manhã de 31 de agosto, na sede da Fecomercio, em São Paulo.

Estavam presentes o presidente do Conselho de Estudos Políticos da Federação, Cláudio Lembo, o presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Jésus Trindade Barreto Jr., o secretário-geral do Fórum, Renato Sérgio de Lima, o diretor-executivo do Instituto Sou da Paz, Denis Mizne, o professor titular do Departamento de Pós-Graduação em Sociologia e diretor do Instituto de Filosofia e Ciências Humanas da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, José Vicente Tavares dos Santos, entre outros.

O debate levantou questões fundamentais, como a unificação, a municipalização, o ciclo completo de polícia e a eficiência do sistema de justiça criminal do país. Na ocasião, também foi apresentado um documento inédito com propostas para atuação do próximo governo federal nesse campo, compilado a partir de debates públicos realizados com especialistas da área em vários estados.

José Marcelo Zacchi – membro do conselho do Fórum - foi enfático ao afirmar que houve avanço nas questões de melhoria da segurança pública. No entanto, garante que ainda há muito que fazer: “É preciso aprimorar a formação profissional, o controle da corrupção e violência dos agentes públicos (polícias, órgãos e gestores dos sistemas judicial e penitenciário), o planejamento e gestão nas secretarias de segurança, a defesa social nas polícias, a transparência, a participação social, a formação e qualificação dos profissionais, além, é claro, de melhorias nas condições de trabalho e remuneração dos policiais”, disse.

O assunto é complexo. Com 3% da população mundial, o Brasil é responsável por 9% dos homicídios cometidos em todo o planeta. esse tipo de crime cresceu 29% na década passada e entre os jovens esse crescimento foi de 48%. Segundo levantamento do Instituto Fernand Braudel, de São Paulo, o custo estimado da violência no Brasil seria de 300 milhões de reais por dia, ou seja, 109 bilhões e 500 milhões de reais por ano.


“É preciso um aumento brutal nos investimentos, pois 50 mil pessoas por ano — vítimas da violência — estão morrendo no país. O setor deve ter prioridade orçamentária, sem economia, pois os aumentos nos financiamentos ainda não são suficientes”, enfatizou o diretor-executivo do Instituto Sou da Paz, Denis Mizne (na foto, segundo à esquerda).

O consenso entre os participantes é que, para diminuir os índices de violência e melhorar a segurança pública no Brasil, é preciso ir além do policiamento. É preciso rever o processo penal, agilizar os processos, a gradação e a modalidade das penas, a tipificação dos delitos, sua ampliação ou alteração. “Não existe segurança sem justiça”, definiu o major da Polícia Militar de São Paulo Glauco Carvalho, assessor do Conselho de Estudos Políticos da Fecomercio.

Sistema prisional


A discussão também destacou a precariedade do sistema prisional no país. Os números são preocupantes, se levarmos em conta que a população carcerária aumenta 75% por ano. Para Mizne, não adianta aumentar o número de presídios se não houver revisão no sistema. “Atualmente, de cada cinco presos, um é ilegal. Ou seja, ou já cumpriu sua pena ou poderia estar no regime semiaberto”.

Dados do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), divulgados no fim de 2009, apontam que existe um déficit de mais de 170 mil vagas nos presídios brasileiros. Para sanar essa falta de vagas, seria necessário um investimento em torno de R$ 3 bilhões. Todavia, suspeita-se que o déficit de vagas pode ser ainda maior, pois, em alguns estados, a quantidade de presos é superior às informadas.

O fórum concluiu que é necessário um combate à morosidade judicial, a redução do encarceramento de presos provisórios e novas abordagens para os crimes de menor complexidade.

Na contramão


Se por um lado ainda há muito que ser feito, por outro, muitos foram os avanços nos últimos anos, com bons exemplos a serem seguidos. O Jardim Ângela, na zona sul de São Paulo, possui mais de 300 mil habitantes e já foi considerado pela ONU a região mais violenta do planeta.

Segundo um levantamento da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade), publicado em julho de 2005, entre 2000 e 2004, a taxa de homicídios por 100 mil habitantes caiu mais de 45% na região, de 118,31 para 64,5.

A queda acentuada nos índices de homicídios só ocorreu depois que a comunidade tomou consciência e se envolveu no processo para buscar soluções. Além disso, houve esforço conjunto dos órgãos públicos e a atuação de diversas entidades que passaram a atuar no bairro. A Polícia Militar implantou bases comunitárias na região e o governo ampliou o número de equipamentos públicos disponíveis para os moradores.

O modelo de Polícia Comunitária foi defendido pelos integrantes do debate. Segundo o coronel da Polícia Militar de São Paulo, Luiz Eduardo Pesce de Arruda, do Centro de Altos Estudos de Segurança (Caes), é preciso investir na capacitação e na qualificação dos policiais. “Precisamos acabar com a austeridade da nossa corporação e criar uma interlocução confiável entre PM e comunidade. Somente assim conseguiremos respeito e trabalho em conjunto”, afirmou. De acordo com o coronel, o governo do estado pretende alavancar os programas existentes que deram resultados e aumentar os investimentos em novas tecnologias e armas e técnicas não letais.

Um novo modelo de polícia

Sem consenso entre os debatedores, a unificação das polícias Civil e Militar acabou ficando em segundo plano. No entanto, os participantes acreditam que é preciso definir o papel da Guarda Municipal e aprimorar o policiamento de fronteiras, portos e aeroportos.

“O governo federal precisa assumir mais responsabilidades sobre o tema, criar e sugerir os modelos ideais de segurança, criar parcerias externas e investir no policiamento de fronteira e nos serviços de inteligência”, declarou Denis Mizne.

Independentemente da unificação das corporações, o professor da UFRGS, José Vicente Tavares dos Santos, acredita que o Brasil é um dos poucos países que avança positivamente na qualificação dos profissionais de segurança, investindo em parcerias com universidades e formando profissionais no curso superior de Polícia.

Incentivo e participação do setor privado

As discussões realizadas pelo Fórum serviram como ideia para a criação da cartilha “Participação do Setor Privado na Segurança Pública no Brasil", uma publicação feita pelo FBSP, Instituto Ethos e CPFL Energia. O intuito é mostrar boas experiências que possam apoiar políticas de segurança e prevenção da violência nas áreas em que a empresa está localizada, como é o caso do Programa Ações Locais, da Viva o Centro, que envolve comunidade e iniciativa privada em busca de soluções para o bom convívio no Centro da Capital.

Clique para baixar a cartilha



Comentário do Blog:


Uma pena deixarem para "segundo plano", como bem disse a matéria, um assunto primordial no debate da Segurança Pública: a reforma do sistema policial. Isto, tanto no que se refere a 'limpar' os frutos podres, quanto a unificação, otimização dos serviços, transparência nos dados, melhor remuneração e capacitação, dentre muitas outras coisas que fazem da nossa polícia, uma questão central quando se fala em Segurança. Realmente uma pena...

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