Por Marcelo Semmer
A guerra contra as drogas não surtiu qualquer efeito. A Lei dos Crimes Hediondos superlotou cadeias e criou condições para o crescimento das facções criminosas no sistema penitenciário, sem reduzir a criminalidade. A discussão sobre novas formas de tratamento da questão das drogas é inevitável.
A lei dos crimes hediondos foi editada em 1990, aumentando as penas de crimes graves e fixando o cumprimento destas integralmente em regime fechado. A medida visava, entre outros delitos, reprimir com mais rigor o tráfico de entorpecentes.
Quinze anos depois, o número de presos no país havia simplesmente dobrado. Mas o volume da comercialização dos entorpecentes depois da lei foi muito superior ao que havia no começo da década de 90. Aumentaram-se as penas e também os crimes.
Este é apenas um dos sintomas de que a guerra contra as drogas, política que se inicia com Nixon nos anos 70 e se espalha mundo afora, não vem surtindo o efeito desejado. O consumo aumenta diariamente e os crimes praticados em razão dos tóxicos também.
O crescimento geométrico da população carcerária, inflada por milhares de jovens usuários em contato com as leis penais, acabou provocando justamente o fortalecimento de facções criminosas como o PCC, devolvendo para a sociedade, amplificados, todos os males do sistema penitenciário.
Já faz tempo que estamos apagando fogo com querosene.
Na dúvida, o Congresso editou duas legislações sobre entorpecentes nos últimos dez anos, e há uma clara movimentação para criação de nova lei.
Afinal, a maioria das prisões e condenações pelo tráfico se direciona aos pequenos vendedores, último estágio do comércio ilícito. Ao serem presos, são rapidamente substituídos por outros. E é neste enorme contingente de jovens detentos que as facções criminosas recrutam um exército que não para de crescer.
O tráfico segue intacto e seu combate se tornou um contínuo enxugar de gelo.
Com a coleção de fracassos e em vista das enormes dificuldades para a punição, será inevitável reabrir o debate acerca da descriminalização do uso das drogas, em especial para retirar de vez o usuário do sistema penal, além de adequar as sanções aos pequenos traficantes.
A questão sanitária quase sempre é esquecida quando se debate entorpecentes. E é pouco lembrado que as drogas, enfim, não são impostas aos consumidores, mas adquiridas pelos usuários. Fazer com que eles deixem de comprá-las é mais uma questão de saúde pública do que propriamente de segurança.
Questão difícil é verdade, dentro de uma sociedade fortemente seduzida pelas soluções rápidas, que privilegia o imediatismo nos resultados. Fármacos são expostos como respostas urgentes para qualquer problema, desde o emagrecimento até a virilidade, passando pela própria felicidade.
Diante da comercialização efusiva de tantas drogas lícitas, com promessas miraculosas das mais variadas, é tarefa ingrata convencer a juventude a não buscar também respostas mágicas para seus males ou incômodos. E proibir muitas vezes é sinônimo de estimular.
Em face das incertezas, tudo o que não se deve fazer neste momento, é interditar o debate ou criminalizar a discussão.
As proibições de manifestações pela descriminalização do uso do entorpecente, como poderiam ser pela do aborto ou da eutanásia, para citar dois exemplos de leis amplamente questionáveis, são inócuas e ainda esgarçam a liberdade de expressão do Estado de Direito que tais ordens supõem tutelar.
Afinal, as reflexões sobre a pouca eficácia da repressão ao uso de entorpecentes e, em especial, a descriminalização da maconha, inexoravelmente, já estão em marcha.
Marcelo Semmer é juiz de direito em São Paulo e escritor. Membro e ex-presidente da Associação Juízes para a Democracia, autor do romance "Certas Canções". Colunista no Terra Magazine.
Concordo plenamente com suas palavras.
ResponderExcluirRealmente, é o que esta ocorrendo !
Sérgio F. Oliveira presidente do consep-juatuba, M.G
Muuuuuuito bom, muito bom! adorei este texto.
ResponderExcluirAbraços
;)