Por Vitor Abdala - Blog Rio.40
Senad lamenta a inexistência do conselho, que envolve governo e sociedade na luta contra as drogas, no estado do Rio e diz que políticas de prevenção e recuperação de usuários fica comprometida
Ontem tive a oportunidade de participar da abertura da II Conferência Latinoamericana sobre Drogas, que aconteceu na Faculdade de Direito da UFRJ. Assisti à abertura como jornalista, pois fazia a cobertura do evento pela agências de notícias onde trabalho.
Durante a abertura, a fala de um dos palestrantes de me chamou a atenção. Tratou-se do secretário nacional de Políticas sobre Drogas da Presidência da República, o general Paulo Roberto Uchoa.
Apesar de pertencer a um governo aliado do governo estadual do Rio de Janeiro, Uchoa lamentou profundamente a inexistência de um conselho estadual para políticas de drogas no estado do Rio.
General Uchoa disse que, sem os conselhos estaduais funcionando, o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas não vai funcionar com êxito. A instituição do sistema foi determinada pela Lei Antidrogas brasileira (11.343 de 2006).
De acordo com a lei, o sistema tem a finalidade de articular, integrar, organizar e coordenar as atividades relacionadas com:
I - a prevenção do uso indevido, a atenção e a reinserção social de usuários e dependentes de drogas;
II - a repressão da produção não autorizada e do tráfico ilícito de drogas.
Segundo o general, para que o sistema tenha êxito, é preciso que estados, como o Rio de Janeiro, tenham seus conselhos de políticas para as drogas funcionando.
Para Uchoa, sem o conselho funcionando, fica difícil bolar estratégias de prevenção (o que impedirá o surgimento de novos usuários de drogas) e recuperação de usuários.
Se entendi bem o que falou o czar da luta contra as drogas no Brasil, sem o conselho estadual, as estratégias de redução da demanda por entorpecentes no Rio de Janeiro ficam capengas.
E especialistas são quase unânimes em afirmar que, enquanto houver demanda, haverá tráfico de drogas. Ou seja, por mais que se combata a oferta de drogas, o tráfico não acabará, porque sempre haverá uma forma de levar o produto proibido ao público consumidor.
O paradoxo dessa história é que o governador do Rio de Janeiro, Sergio Cabral, se gaba de estar combatendo, sem trégua o tráfico.
Espera aí. Se Cabral não criou o conselho estadual de políticas sobre drogas (Lembre-se que o sistema nacional dos conselhos de segurança é uma proposta da lei de 2006. Cabral assumiu em 2007 e passou um mandato inteiro sem criar o conselho). Se a Senad diz que, sem o conselho, a política de redução da demanda fica comprometida. Se os especialistas dizem que o tráfico não acaba enquanto houver demanda. Como o governador pode dizer que o estado do Rio de Janeiro está combatendo o tráfico sem trégua?
Uma política contra as drogas que não se orienta para a redução da demanda é como se fosse um cachorro correndo atrás do próprio rabo.
Fica óbvio que a política sobre drogas do Rio de Janeiro não está no caminho certo, por mais que o governador e a imprensa queiram nos convencer do contrário.
O que fez o governo do Rio de Janeiro em relação às drogas? Bem, basicamente duas coisas. A primeira delas foi repetir a mesma coisa que seus antecessores vinham fazendo há 20 anos. Operações policiais rotineiras na favela, com trocas de tiros, mortes, balas perdidas e sem qualquer resultado prático.
A segunda foi criar uma política chamada de Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), que tomou para si o conceito de políticas anteriores, como o Gpae (Policiamento em /reas especiais), ampliou o efetivo policial (que nessas estratégias anteriores era reduzido) e passou a ocupar favelas do Rio de Janeiro.
Mas o que, na prática como funcionam as UPP? As unidades pacificadoras, na prática, trabalham com a lógica da ocupação territorial. Isso significa que elas têm o objetivo básico de ocupar um território antes ocupado por uma quadrilha armada. Ou seja, elas têm expulsado as quadrilhas das favelas que elas ocupam. Isso mesmo, expulsando. Não desarticulando-as, mas expulsando-as. Que isso fique bem claro.
Além disso, são poucas as UPP para o tamanho do problema fluminense. O Rio tem entre 1.500 e 2 mil favelas controladas por grupos armados. Até hoje, apenas 35 favelas receberam UPP. A previsão da Secretaria de Segurança do estado é estender o projeto para, no máximo, cerca de 150 favelas.
Enfim, o que quero dizer aqui é que a principal política de segurança do Rio de Janeiro (as tão celebradas UPP) têm um efeito muito limitado sobre o tráfico de drogas no estado.
Elas atuam sobre o território. Mas a maioria dos criminosos envolvidos com a venda de drogas continua solta, apenas mudando de endereço. Ou permanecendo em seu endereço, mas sem usar aquele fuzilzão (recorrendo apenas a uma pistolinha para garantir seus negócios).
As UPP tampouco atacam os arsenais das quadrilhas (até porque muitas quadrilhas retiram suas armas da favela, já que o governador os avisa da ocupação policial antecipadamente). Ou seja, os grupos criminosos continuam armados e vão usar suas armas em outra freguesia.
Quanto às drogas, elas não parecem ser o foco principal das UPP, tendo em vista que a venda de entorpecentes continua nas favelas, mesmo com a ocupação policial. O próprio secretário de segurança, José Mariano Beltrame, já afirmou, em diversas ocasiões, que o objetivo das UPP não é acabar com o tráfico.
Se o quadro já não fosse ruim o suficiente, tomamos conhecimento de que o estado do Rio de Janeiro não tem uma estratégia (ou pelo menos tem uma estratégia capenga) para atacar o principal motivador do tráfico: a demanda por drogas.
Bem, sem acabar com a demanda, com as armas e com os criminosos, o que vai acontecer é que os consumidores vão comprar a droga, onde quer que ela esteja.
Por mais que você ocupe favelas, enquanto houver gente querendo fumar, cheirar ou se picar, sempre haverá espaços no estado que os criminosos possam ocupar para manter suas atividades ilegais.
Senad lamenta a inexistência do conselho, que envolve governo e sociedade na luta contra as drogas, no estado do Rio e diz que políticas de prevenção e recuperação de usuários fica comprometida
Ontem tive a oportunidade de participar da abertura da II Conferência Latinoamericana sobre Drogas, que aconteceu na Faculdade de Direito da UFRJ. Assisti à abertura como jornalista, pois fazia a cobertura do evento pela agências de notícias onde trabalho.
Durante a abertura, a fala de um dos palestrantes de me chamou a atenção. Tratou-se do secretário nacional de Políticas sobre Drogas da Presidência da República, o general Paulo Roberto Uchoa.
Apesar de pertencer a um governo aliado do governo estadual do Rio de Janeiro, Uchoa lamentou profundamente a inexistência de um conselho estadual para políticas de drogas no estado do Rio.
General Uchoa disse que, sem os conselhos estaduais funcionando, o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas não vai funcionar com êxito. A instituição do sistema foi determinada pela Lei Antidrogas brasileira (11.343 de 2006).
De acordo com a lei, o sistema tem a finalidade de articular, integrar, organizar e coordenar as atividades relacionadas com:
I - a prevenção do uso indevido, a atenção e a reinserção social de usuários e dependentes de drogas;
II - a repressão da produção não autorizada e do tráfico ilícito de drogas.
Segundo o general, para que o sistema tenha êxito, é preciso que estados, como o Rio de Janeiro, tenham seus conselhos de políticas para as drogas funcionando.
Para Uchoa, sem o conselho funcionando, fica difícil bolar estratégias de prevenção (o que impedirá o surgimento de novos usuários de drogas) e recuperação de usuários.
Se entendi bem o que falou o czar da luta contra as drogas no Brasil, sem o conselho estadual, as estratégias de redução da demanda por entorpecentes no Rio de Janeiro ficam capengas.
E especialistas são quase unânimes em afirmar que, enquanto houver demanda, haverá tráfico de drogas. Ou seja, por mais que se combata a oferta de drogas, o tráfico não acabará, porque sempre haverá uma forma de levar o produto proibido ao público consumidor.
O paradoxo dessa história é que o governador do Rio de Janeiro, Sergio Cabral, se gaba de estar combatendo, sem trégua o tráfico.
Espera aí. Se Cabral não criou o conselho estadual de políticas sobre drogas (Lembre-se que o sistema nacional dos conselhos de segurança é uma proposta da lei de 2006. Cabral assumiu em 2007 e passou um mandato inteiro sem criar o conselho). Se a Senad diz que, sem o conselho, a política de redução da demanda fica comprometida. Se os especialistas dizem que o tráfico não acaba enquanto houver demanda. Como o governador pode dizer que o estado do Rio de Janeiro está combatendo o tráfico sem trégua?
Uma política contra as drogas que não se orienta para a redução da demanda é como se fosse um cachorro correndo atrás do próprio rabo.
Fica óbvio que a política sobre drogas do Rio de Janeiro não está no caminho certo, por mais que o governador e a imprensa queiram nos convencer do contrário.
O que fez o governo do Rio de Janeiro em relação às drogas? Bem, basicamente duas coisas. A primeira delas foi repetir a mesma coisa que seus antecessores vinham fazendo há 20 anos. Operações policiais rotineiras na favela, com trocas de tiros, mortes, balas perdidas e sem qualquer resultado prático.
A segunda foi criar uma política chamada de Unidades de Polícia Pacificadora (UPP), que tomou para si o conceito de políticas anteriores, como o Gpae (Policiamento em /reas especiais), ampliou o efetivo policial (que nessas estratégias anteriores era reduzido) e passou a ocupar favelas do Rio de Janeiro.
Mas o que, na prática como funcionam as UPP? As unidades pacificadoras, na prática, trabalham com a lógica da ocupação territorial. Isso significa que elas têm o objetivo básico de ocupar um território antes ocupado por uma quadrilha armada. Ou seja, elas têm expulsado as quadrilhas das favelas que elas ocupam. Isso mesmo, expulsando. Não desarticulando-as, mas expulsando-as. Que isso fique bem claro.
Além disso, são poucas as UPP para o tamanho do problema fluminense. O Rio tem entre 1.500 e 2 mil favelas controladas por grupos armados. Até hoje, apenas 35 favelas receberam UPP. A previsão da Secretaria de Segurança do estado é estender o projeto para, no máximo, cerca de 150 favelas.
Enfim, o que quero dizer aqui é que a principal política de segurança do Rio de Janeiro (as tão celebradas UPP) têm um efeito muito limitado sobre o tráfico de drogas no estado.
Elas atuam sobre o território. Mas a maioria dos criminosos envolvidos com a venda de drogas continua solta, apenas mudando de endereço. Ou permanecendo em seu endereço, mas sem usar aquele fuzilzão (recorrendo apenas a uma pistolinha para garantir seus negócios).
As UPP tampouco atacam os arsenais das quadrilhas (até porque muitas quadrilhas retiram suas armas da favela, já que o governador os avisa da ocupação policial antecipadamente). Ou seja, os grupos criminosos continuam armados e vão usar suas armas em outra freguesia.
Quanto às drogas, elas não parecem ser o foco principal das UPP, tendo em vista que a venda de entorpecentes continua nas favelas, mesmo com a ocupação policial. O próprio secretário de segurança, José Mariano Beltrame, já afirmou, em diversas ocasiões, que o objetivo das UPP não é acabar com o tráfico.
Se o quadro já não fosse ruim o suficiente, tomamos conhecimento de que o estado do Rio de Janeiro não tem uma estratégia (ou pelo menos tem uma estratégia capenga) para atacar o principal motivador do tráfico: a demanda por drogas.
Bem, sem acabar com a demanda, com as armas e com os criminosos, o que vai acontecer é que os consumidores vão comprar a droga, onde quer que ela esteja.
Por mais que você ocupe favelas, enquanto houver gente querendo fumar, cheirar ou se picar, sempre haverá espaços no estado que os criminosos possam ocupar para manter suas atividades ilegais.
É tem mais um problema, querer acabar com a demanda na esperança de que assim o tráfico termine é simplesmente impossível. A demanda sempre existiu e sempre existirá, seja suprida pelo tráfico ou pelo mercado legal.
ResponderExcluirO tráfico não começou a existir por causa da demanda, começou a existir por causa da proibição do comércio.
Essa demanda tem que ser direcionada a outro tipo de mercado, ao mercado legalizado, controlado pelo governo.
A proibição tentou evitar que a sociedade convivesse com as drogas, e o que aconteceu? Continuamos convivendo com as drogas e da pior forma possível, junto com a violência do mercado delas.