Mostrando postagens com marcador reforma da polícia. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador reforma da polícia. Mostrar todas as postagens

quinta-feira, 3 de outubro de 2013

PEC 51: proposta de mudança radical das polícias




Senador Lindbergh Farias (PT-RJ) – Autor da PEC 51. Foto: Assessoria.

Os que acompanharam e acompanham o jogo político em torno da tentativa de aprovação do Piso Salarial Nacional para os policiais e bombeiros brasileiros flagraram a atuação do Governo Federal, e de sua base aliada, para barrar a medida – que ficou popularizada como “PEC 300″, embora mudanças tenham ocorrido no conteúdo da proposta. Por isso, chama a atenção que uma referência nacional do Partido dos Trabalhadores, o senador Lindbergh Farias (PT-RJ), tenha apresentado uma Proposta de Emenda Constitucional que altera radicalmente a atual configuração das polícias brasileiras, a PEC 51.

Confira abaixo algumas das medidas contidas na PEC, que engloba muitas reivindicações majoritárias nas polícias (lembrando que, em alguns casos, a maioria nem sempre “vence”):


DESVINCULAÇÃO DAS FORÇAS ARMADAS: “A fim de prover segurança pública, o Estado deverá organizar polícias, órgãos de natureza civil, cuja função é garantir os direitos dos cidadãos, e que poderão recorrer ao uso comedido da força, segundo a proporcionalidade e a razoabilidade, devendo atuar ostensiva e preventivamente, investigando e realizando a persecução criminal”; 

CARREIRA ÚNICA: “Todo órgão policial deverá se organizar por carreira única”;

CICLO COMPLETO: “Todo órgão policial deverá se organizar em ciclo completo, responsabilizando-se cumulativamente pelas tarefas ostensivas, preventivas, investigativas e de persecução criminal.”;

AUTONOMIA DOS ESTADOS: “Os Estados e o Distrito Federal terão autonomia para estruturar seus órgãos de segurança pública, inclusive quanto à definição da responsabilidade do município, observado o disposto nesta Constituição, podendo organizar suas polícias a partir da definição de responsabilidades sobre territórios ou sobre infrações penais.”;

OUVIDORIAS INDEPENDENTES: “O controle externo da atividade policial será exercido por meio de Ouvidoria Externa, constituída no âmbito de cada órgão policial, dotada de autonomia orçamentária e funcional, incumbida do controle da atuação do órgão policial e do cumprimento dos deveres funcionais de seus profissionais”.




Luiz Eduardo Soares (Antropólogo e Ex-secretário Nacional 
de Segurança, autor de “Elite da Tropa”, fez parte 
da construção da PEC 51. Foto: Arquivo do autor.

Para construir a Proposta, o senador Lindhberg – que é pré-candidato a Governador do Rio de Janeiro – contou com o auxílio de Luiz Eduardo Soares, Ex-secretário Nacional de Segurança Pública, Antropólogo e autor de vários estudos e livros na área de segurança pública. Em seu perfil do facebook, Luiz Eduardo comentou a apresentação da PEC:

“Com grande alegria, depois de anos de trabalho e ansiedade, comunico a apresentação pelo senador Lindbergh Farias (RJ) da PEC 51/2013 (desmilitarização e muito mais). Foi um privilégio participar da elaboração da proposta. Um longo e difícil parto. Mas aí está. Começa a tramitar no Senado. Será examinada na CCJ. Não creio que seja aprovada, pois promoveria uma verdadeira revolução na arquitetura institucional da segurança pública. Mas pelo menos agora há uma bandeira concreta pela qual lutar e um caminho apontado. Muitos discordarão, outros concordarão, mas um modelo está aí, sobre a mesa para o debate público.

Um passo foi dado com essa proposta de reforma constitucional, saindo daquele dilema pobre e insolúvel, unifica ou não, como se não houvesse todo um vasto universo de possibilidades. A PEC 51/2013 propõe a desmilitarização, polícias de ciclo completo organizadas por territórios ou tipos criminais, carreira única no interior de cada instituição, maiores responsabilidades para a União e os municípios, controle externo com ampla participação social. Polícia é definida como instituição destinada a garantir direitos, comprometida com a vida, a liberdade, a equidade. E as mudanças dar-se-ão ao longo de um tempo suficientemente elástico para evitar precipitações. Todos os direitos trabalhistas dos profissionais serão integralmente respeitados.

Cada estado terá a liberdade de tomar suas próprias decisões, com ampla participação popular, escolhendo a solução mais adequada a suas características, a partir de um repertório que a Constituição definirá –em havendo o acolhimento da PEC–, nos termos acima expostos. Se a PEC for aprovada, estará decretado o fim do sistema institucional que a ditadura nos legou e que tem impedido a democratização do país, nesse campo tão sensível e estratégico, sobretudo para os grupos sociais mais vulneráveis. Se a PEC for acolhida, estará iniciado o desmonte das tenazes que a ditadura deixou plantada no coração da democracia brasileira. Estará aberta a porta para a transformação profunda das culturas corporativas que impedem a identificação dos agentes da segurança pública com os valores da cidadania.

Agora, é preciso trazer a proposta ao conhecimento da sociedade, dos movimentos e continuar, nas praças públicas, o diálogo que vem sendo travado há anos com os profissionais das polícias, privadamente, por motivos óbvios –entre os quais, o veto à sindicalização dos policiais militares, que também ficará no passado se tivermos êxito. A PEC terá impacto benéfico também para os policiais. Além da carreira única (que interessa aos não-oficiais e aos não-delegados, a imensa maioria dos trabalhadores policiais), propõe mecanismos que protejam os profissionais das violações a seus direitos perpetrados por suas próprias instituições. A luta prossegue, mas agora, espero, em outro patamar. Parabéns pela coragem, Lindbergh. Sei que vai haver muito desgaste porque o corporativismo das camadas superiores das instituições reagirá, assim como setores conservadores da mídia e da opinião pública. Mas talvez um dia a sociedade em seu conjunto talvez reconheça o avanço que essa iniciativa pode promover.”

Em um só documento propostas significativas foram reunidas, que certamente receberão uma enxurrada de contraposições ideológicas e, principalmente, corporativistas – como já ocorre contra cada uma delas em separado. De qualquer modo, parece significativo que um aliado do alto escalão do Governo Federal esteja interessado em discutir medidas progressistas para a reforma das polícias brasileiras.

Vamos ler, estudar e nos posicionar sobre cada um dos itens, todos eles centrais se quisermos pensar novas polícias.

Via Abordagem Policial


quinta-feira, 9 de agosto de 2012

O que substituirá as Polícias Militares?


Por Danillo Ferreira*

Não é vocação das polícias brasileiras serem cidadãs, democráticas, comunitárias e humanas: com seu público interno ou com seu público externo, sujeito dos seus serviços. Basta ler a Constituição Federal para se dar conta de que os policiais militares, por exemplo, não podem se sindicalizar, sendo legalmente tratados como semicidadãos, embora sejam cobrados como vetores de cidadania. O Código Penal Militar (1969), a que todos os PMs e BMs brasileiros estão submetidos, foi decretado por ministros militares “usando das atribuições” conferidas pelo famigerado Ato Institucional nº 5, o AI-5.

Por outro lado, pesquisas se amontoam demonstrando que no Brasil, quando se trata de atuação policial, o nível de violência praticada por parte do Estado supera em muito o tolerável, notadamente no que se refere a execuções extrajudiciais tendo como amparo autos de resistência forjados.

É simples entender por que aqui se utiliza o termo “vocação”. É que nossas polícias não nasceram para garantir direitos de minorias, para evitar que injustiças sociais ocorram, nem para evitar que os mais fortes abusem dos mais fracos. Elas possuem em seu nascedouro certa orientação para as garantias do poder governamental de ocasião, que costuma replicar os interesses de certas elites, já que estamos falando do sistema político-eleitoral brasileiro.

Sim, em muitos momentos nossas polícias atuam em observância aos preceitos cidadãos, democráticos, comunitários e humanos. Mas este não é seu talento: é como se diferenciássemos Mozart e sua capacidade inata de lidar com a música de um homem já idoso que resolve aprender tocar piano por distração. Aliás, não parece mais que isto a relação das polícias com estes conceitos, uma espécie de “cereja do bolo”, um enfeite pronto para dar certo toque publicitário à atuação policial, admitido de bom grado por grande parte da nossa imprensa.

Neste contexto, virou moda pedir a cabeça das polícias militares, como se só as PMs fossem praticantes de abusos. Seria útil para os que sustentam este discurso, primeiramente, definir o que vem a ser “polícia militar”. Se significa ser violenta em sua atuação, teremos que extinguir polícias civis, instituições prisionais e até mesmo algumas recém-criadas guardas municipais. Como se vê, o problema é muito maior do que a tentação de criar um bode expiatório, alimentado principalmente por rancores ideológicos que o termo “militar” adquiriu no país.

O Brasil não pode correr o risco de perder outra oportunidade de remodelação das polícias brasileiras – 1988 passou, uma Constituição com pretensões democráticas foi promulgada e a discussão sobre o modelo de polícia está no vácuo até hoje. Mudar é urgente, mas não se trata de um passo no escuro: além de saber qual polícia não q
ueremos, é preciso discutir e definir a polícia que queremos. Iniciar garantindo cidadania, dignidade e humanidade aos próprios policiais é um boa prioridade a ser definida.


*Danillo Ferreira é tenente da Polícia Militar da Bahia, estudante de Filosofia, autor do blog www.abordagempolicial.com e associado do Fórum Brasileiro de Segurança Pública

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Nova era nas Polícias do Rio? Será?

Do Observatório de Favelas

Policiais durante apreensão de drogas e armas,
em operação no conjutno de favelas do Alemão,
em novembro de 2010.
Foto: Elisângela Leite / Imagens do Povo

Desde as últimas semanas o Rio de Janeiro vem passando por uma crise institucional em suas polícias. Na verdade, os problemas agora ganharam visibilidade, graças à Operação Guilhotina, da Polícia Federal, que prendeu dezenas de policiais – sendo nove civis e 22 militares – ligados a traficantes e milícias. O principal preso, o subchefe da Polícia Civil Carlos Oliveira, é ex-braço direito de Alan Turnowski, ex-chefe da Polícia civil que acabou entregando o cargo quatro dias depois do início da Operação.

Os acusados ajudavam traficantes, milicianos e contraventores com informações sobre as operações policiais, negociando material de apreensão e até dando proteção a criminosos. Os policiais presos são acusados de colaborar justamente com os crimes que deviam investigar.

Com a saída de Turnowski, o secretário de Segurança do Rio, José Mariano Beltrame, indicou a delegada Marta Rocha para substituí-lo. Marta ocupava a direção geral da Divisão de Polícias de Atendimento à Mulher (DPAM) e está na Polícia Civil desde 1983. Ela foi responsável pelas investigações do caso do Ônibus 174, em 2000, que terminou com a morte de uma refém e do seqüestrador. À época ela indiciou o comandante do Bope que participava da operação.

Uma mudança na estrutura da Polícia Civil no Rio de Janeiro é muito bem vinda e se fazia mais do que necessária. No entanto, entre os delegados indicados pela nova chefe, praticamente todos apresentam questionamentos. O delegado Fernando Veloso, agora subchefe operacional, enquanto titular da DEAT teve o seu chefe do SI preso na Operação Furacão; a nova diretora da Acadepol, delegada ‎Jéssica Oliveira de Almeida, responde ação civil pública por improbidade administrativa; o novo titular da DRFC, Marcos Cipriano, responde por extorsões a “playboys’ acusados de tráfico em Niterói, na época em que chefiava SRE-Nit; já o novo diretor do DGPE, delegado Marcio Franco, administra a empresa de segurança Delta Force, que fica no bairro do Rio Comprido e está em nome de sua mãe; o novo titular da DGPC é o delegado Ricardo Dominguez, que já foi condenado por tortura à pena de 15 anos de reclusão, perda do cargo e interdição para o exercício de função policial por 30 anos; e o corregedor da PCERJ, Gilson Emliano Soares, mantido da gestão anterior, já foi afastado do cargo quando era chefe do Instituto de Criminalística Carlos Éboli (ICCE) de São Gonçalo, quando uma arma que deveria estar em posse do ICCE foi encontrada com um traficante em Niterói.

Além das mudanças na Polícia Civil com a chegada da delegada Martha Rocha, que assumiu o cargo afirmando que vai fortalecer a corregedoria, o atual comandante-geral da Polícia Militar do Estado do Rio, coronel Mário Sérgio Duarte, pediu para a corregedoria interna da corporação maior rigor e a implementação de novas medidas de combate a desvios de conduta.

Nosso desejo – comum a quem busca uma cidade e um estado mais justo e humano – é de que essa mudança na polícia seja de fato na perspectiva de mudar esses vícios e dificuldades existentes. Esperamos, sinceramente, que a Operação Guilhotina não prenda alguns maus policiais e pare por aí. Queremos que o debate sobre a Segurança Pública no Rio seja expandido, problematizado e discutido. Se levada às últimas consequências, a Operação Guilhotina pode significar o início de uma nova era nas Polícias do Rio.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Polícia de proximidade: sem informações, polícia age num tunel escuro


Por Marcos Rolim

O recurso mais importante para qualquer polícia do mundo é a informação. Uma polícia sem informações não sabe o que fazer e age como se estivesse em um túnel escuro.

A mais ampla e importante fonte de informação para o trabalho policial é o povo. Mas a população só informa a polícia se confiar nela. Por isso, aumentar a confiança nas polícias é um desafio central, especialmente quando a imagem das instituições for ruim e estiver associada à ineficiência, à corrupção e à violência. O atendimento prestado à cidadania, a educação dos policiais e os êxitos alcançados pelas polícias ajudam muito, mas confiança exige proximidade dos policiais com as pessoas.

Nosso modelo de polícia está fundado em uma concepção reativa onde os policiais patrulham aleatoriamente as cidades, dentro de viaturas, atendendo aos chamados de emergência do sistema 190. Os residentes não conhecem os policiais que, por sua vez, tampouco conhecem os moradores. Na ausência de vínculos, o que temos é uma “polícia estranha” às comunidades e que aparece, como regra, apenas depois que um crime já foi cometido.

A ideia de fixar policiais em pequenos distritos, para o patrulhamento fora de viaturas, normalmente a pé, em contato direto com as pessoas, é o começo de uma mudança essencial em direção ao modelo de polícia comunitária. Nos países de democracia consolidada, esta tem sido uma das mais fortes tendências no policiamento nos últimos 30 anos. Com o policiamento de proximidade, os profissionais de segurança passam a conhecer os residentes por seus nomes, passam a entender as dinâmicas sociais da região, têm mais condições de auxiliar as pessoas em variados momentos de dificuldade (não apenas em ocorrências criminais) e podem construir laços de confiança que lhes permitirão receber as informações que precisam.

As Unidades de Polícia Pacificadora (UPPs) no Rio de Janeiro têm obtido êxitos porque realizam esta dinâmica. Quem tomar este exemplo como suficiente, entretanto, poderá se frustrar. A cidade do RJ possui 1.500 favelas. Há UPPs em 12 delas. Se o governo conseguir instalar uma nova UPP por mês, em 100 anos a cidade não estará coberta. Será preciso, então, reduzir rapidamente as áreas de exclusão social e promover cidadania. Mas o problema maior nem é esse. O problema é que nada nos garante que os policiais recrutados para as UPPs não estarão em breve associados ao crime.

Para evitar este resultado será preciso – além de salários dignos e exigências maiores de recrutamento e formação - a reforma do modelo de polícia, introduzindo o ciclo completo de policiamento e a divisão de responsabilidades entre as policias por tipos criminais, assegurando uma única porta de entrada em cada polícia e, por decorrência, a possibilidade de uma verdadeira carreira policial, etc., o que exige a alteração do art. 144 da Constituição Federal e disposição para mexer em um vespeiro de interesses corporativos e de disputas de poder.

Bem, podemos não fazer isso, por conveniência política ou falta de discernimento. Nesta hipótese, o pesadelo das milícias e da degradação completa da atividade policial surgirá cada vez mais forte no horizonte.

Mais Lidos